Vício de adolescentes em redes sociais pode virar oficialmente em um transtorno mental; entenda

publicado em

Um grupo de cientistas propôs que a relação nociva de alguns adolescentes com as redes sociais e a internet seja oficialmente considerada um novo tipo de transtorno mental.

Caso a proposta, publicada na revista científica JAMA – da Associação Médica Americana -, ganhe impulso e seja aceita, ela poderia entrar no manual de estatísticas e diagnósticos da psiquiatria, o DSM, que influencia políticas públicas no mundo todo.

Segundo os cientistas proponentes, a ideia é que a condição possa também integrar a Classificação Internacional de Doenças, da Organização Mundial da Saúde (OMS).

A revista publicou um artigo sugerindo critérios para determinar o que é o consumo exagerado de mídias sociais e a partir de qual ponto ele se torna um distúrbio médico.

O trabalho foi baseado em uma pesquisa feita pela Universidade de Stony Brook, em Nova York, e liderado pela sanitarista Lauren Hale, que buscava avaliar o quanto o tempo excessivo de tela estava afetando a vida dos adolescentes voluntários.

O pediatra Dimitri Christakis, da Universidade de Washington, inspirado em um critério gradual para avaliar gradações de alcoolismo, propôs uma escala para avaliar a relação patológica de adolescentes com as redes de acordo com o tempo gasto nesse tipo de mídia.

Os dois pesquisadores reforçam que a situação é urgente. Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 95% dos adolescentes possuem smartphones e os profissionais de saúde enfatizam a necessidade de um sistema de classificação para trabalhar com o problema.

“Introduzir essa classificação não poderia ser mais urgente. Enquanto acadêmicos se alongam em discussões abstratas sobre o assunto, mais de seis milhões de adolescentes americanos já estão exibindo o que nós chamamos provisoriamente de consumo pesado de mídia, e uma parcela considerável deles provavelmente já sofre de transtorno de uso de mídia”, escreveram Hale e Christakis.

A proposta inicial da dupla é que se defina inicialmente os limiares de tempo gasto com redes sociais e internet a fim de identificar indivíduos com problemas. Os pesquisadores reconhecem, no entanto, que será preciso discutir o conteúdo consumido, porque o problema está ligado a fenômenos como o bullying e a propagação de conteúdos preconceituosos e ofensivos.

“Embora o debate sobre a existência de algo como transtorno de games, vício em internet ou uso problemático de mídias sociais continue entre acadêmicos e a indústria, o tempo gasto em dispositivos envolvidos em diversas atividades está substituindo as interações do mundo real de maneira tanto sutil quanto dramática”, dizem os cientistas.

Debate antigo

A discussão em torno do assunto não é algo recente. Antes, até mesmo o vício em videogames já foi candidato a entrar como transtorno nos manuais de psicologia, mas a discussão não teve consenso. A OMS adotou a definição, enquanto a comissão de psiquiatras que elabora o DSM não a incorporou.

Uma questão que ainda deve entrar no debate é o quanto a criação de transtornos muito específicos ajuda na compreensão de um problema comportamental complexo e mais abrangente. É possível que não exista um mecanismo psíquico moldado ao vício em redes e que seja digno de embasar a definição de um novo transtorno.

Alguns defensores da proposta afirmam que, mesmo que a criação desse transtorno seja algo arbitrário, é algo que poderia facilitar a relação de médicos com sistemas de saúde, incluindo o financiamento e suporte a terapias e tratamentos. É comum que pedidos de licença ou reembolso, por exemplo, exijam a inclusão de um código da CID em formulários.

Outra questão em discussão é o quanto a compulsão por mídias sociais é causa ou consequência de ansiedade e depressão. Algumas pesquisas, sobretudo com meninas, mostram que existe uma via de mão dupla nessas questões.

“Esse vício é motivado por uma combinação de fatores psicológicos, como baixa autoestima, problemas de saúde mental, mecanismos tecnológicos como rolagem infinita e notificações personalizadas, além de influências sociais, incluindo pressão dos colegas e exposição a conteúdo idealizado”, afirma Jashvini Amirthalingam, psicopediatra do Instituto de Neurociências e Psicologia Comportamental da Califórnia que produziu uma revisão ampla recente sobre estudos relacionados ao assunto.

A pesquisadora reforça que esse universo se tornou um amplo leque da pesquisa sobre saúde mental em crianças e adolescentes. “As plataformas de mídia social deveriam encorajar a conexão, mas também podem criar circunstâncias que promovem hábitos obsessivos, especialmente em jovens mais vulneráveis”, disse.

Devido às complexidades envolvidas no conteúdo discutido, Christakis e Hale reconhecem que a definição de limites de tempo de uso para mídias sociais não vai abarcar todos os elementos da discussão sobre a classificação do problema. Entretanto, argumentam que é um bom ponto de partida.

“O dia tem um número limitado de horas, e considerando que os adolescentes devem dormir de oito a dez horas por dia e frequentar a escola por aproximadamente seis horas, aqueles que usam seus celulares por nove horas por dia (que são 15% em nossos dados) provavelmente o usam durante a escola ou deixam de dormir para fazê-lo. Isso por si só deveria ser causa para preocupação ou mesmo para intervenção”, declararam os cientistas.

O debate sobre como deve ser encarada institucionalmente a relação tóxica de crianças com as telas, redes e videogames ainda está em aberto, mas não impede que os especialistas busquem ajudar os pais que se encontram na linha de frente do problema.

A OMS, por exemplo, publicou um documento com diretrizes a serem seguidas. A organização recomenda que o uso desses dispositivos seja evitado por crianças abaixo de dois anos, e que para crianças de dois a quatro anos não ultrapasse uma hora supervisionada por dia. A ideia é maximizar o tempo de interação com pessoas reais e desestimular o sedentarismo, seja pelo consumo de jogos, desenhos animados ou qualquer atividade em tela.

Ademais, grupos de psicólogos e pediatras estão produzindo diretrizes mais voltadas a crianças maiores e adolescentes que usam redes sociais. Para a faixa etária acima dos 11 anos, a Academia Americana de Pediatria não estabelece um limite de tempo, por exemplo, mas pede atenção para que atividades em telas não prejudiquem sono, esportes e relações pessoais.

A Sociedade Brasileira de Pediatria, por sua vez, segue princípios semelhantes e recomenda que crianças menores de 13 anos não tenham seus próprios perfis em plataformas. O limite, aliás, já é lei nos Estados Unidos e outros países. É recomendado também que o uso de redes sociais entre 13 e 17 anos seja supervisionado.

Outra recomendação bem específica é a de não deixar dispositivos dentro dos quartos das crianças e adolescentes durante a noite, e retirá-los uma a duas horas antes de dormir. Evitar o acesso a telas na hora de faze a lição de casa também é considerado importante. No mais, os pediatras pedem a pais ou responsáveis atenção para sinais problemáticos, como irritabilidade excessiva diante da restrição a tablets ou smartphones.

A Associação Americana de Psicologia possui um conjunto de diretrizes mais aberto do que a dos pediatras. Nesse caso, os profissionais da psicologia pedem foco no “monitoramento e no diálogo”, reforçando que os adolescentes precisam de orientações, não apenas de restrições.

É importante que os pais os ajudem a avaliar a qualidade do conteúdo a ser consumido na internet e evitem fontes propensas a desinformação e hostilidade. Há casos específicos que exigem mais atenção, como adolescentes com histórico de traumas ou problema de autoimagem corporal.

O que você acha do avanço da proposta? Comente abaixo!

Foi útil?
1 Estrela2 Estrelas3 Estrelas4 Estrelas5 Estrelas
Loading...
Sobre Equipe MundoBoaForma

Quando o assunto é saúde, você tem que saber em quem confiar. Sua qualidade de vida e bem-estar devem ser uma prioridade para você. Por isso contamos com uma equipe profissional diversificada e altamente qualificada, composta por médicos, nutricionistas e profissionais de educação física. Nosso objetivo é garantir a qualidade do conteúdo que publicamos, que é também baseado nas mais confiáveis fontes de informação. Tudo isso para que você tenha confiança no MundoBoaForma e faça daqui sua fonte preferencial de consulta para assuntos relacionados à saúde, boa forma e qualidade de vida.

Deixe um comentário