Após uma morte diretamente relacionada ao consumo de altas doses de vitamina D por dia, um médico legista do Reino Unido começou a pressionar a Agência de Padrões Alimentares do país para atualizar a rotulagem de certos suplementos dietéticos.
David Mitchener, 89 anos, foi internado no East Surrey Hospital em maio passado com hipercalcemia, ou seja, sobrecarga de cálcio no sangue. Ele recebeu tratamento, no entanto, morreu 10 dias depois. Em dezembro, o legista iniciou uma investigação e determinou como “morte por desventura”. Esse termo no Reino Unido indica que o falecimento não foi apenas acidental, mas também devido a uma ação que tomou deliberadamente: o consumo de vitamina D.
Na verdade, a causa da morte de Mitchener foi multifacetada: a autópsia aponta hipercalcemia, insuficiência renal aguda, insuficiência cardíaca congestiva e doença cardíaca isquêmica como culpados, além da toxicidade da vitamina D. O legista assistente de Surrey, Jonathan Stevens, estava preocupado com o papel do suplemento no falecimento do homem.
Antes de sua morte, durante nove meses, Mitchner tomou suplementos de vitamina D adquiridos na NaturPlus UK, segundo relatório de 19 de janeiro deste ano. Vários produtos do varejista contém a vitamina, mas o relatório não especificou os que o paciente havia ingerido, qual a frequência e dosagem. Mesmo assim, o documento alegou que as embalagens dos produtos em questão não apresentam advertências adequadas sobre uma possível overdose de suplementos.
“Os suplementos vitamínicos podem ter riscos e efeitos colaterais potencialmente muito graves quando tomados em excesso. Os atuais requisitos de rotulagem de alimentos não exigem que esses riscos e efeitos colaterais sejam escritos (na) embalagem. Na minha opinião, devem ser tomadas medidas para prevenir mortes futuras e acredito que você tem o poder de tomar tais medidas”, disse o profissional.
- Veja também: Excesso de vitamina D faz mal? sintomas e cuidados
O relatório foi enviado à NaturPlus UK, à Food Standards Agency e ao Departamento de Saúde e Assistência Social, que foram obrigados a responder até 15 de março. O retorno ainda não foi divulgado à mídia.
Sem vitamina D, o corpo não consegue absorver cálcio e, assim, não constrói ou mantém ossos fortes. O nutriente, também chamado calciferol, é importante para a saúde dos sistemas imunológico, nervoso e músculo-esquelético. O excesso da vitamina, entretanto, pode causar danos ou até ser fatal, como no caso do paciente estudado.
Nos Estados Unidos, o Escritório de Suplementos Dietéticos recomenda a ingestão diária de vitamina D de 600 UI (15 mcg) para adultos de 19 a 70 anos e 800 UI (20 mcg) para maiores de 71 anos. As vitaminas A, D, E e K são gorduras solúveis, o que significa que podem se dissolver em gorduras e óleos que são armazenados no fígado e no tecido adiposo.
“Se você tomar uma grande quantidade ao longo do tempo, poderá obter níveis mais altos do que o necessário e o corpo não conseguirá se livrar disso”, explicou Joanne Slavin, professor PhD do Departamento de Ciência Alimentar e Nutrição da Universidade de Minnesota, à Fortune.
O Escritório de Suplementos Dietéticos, para prevenir o consumo excessivo, estabeleceu limites: uma pessoa de nove anos ou mais, por exemplo, pode ingerir no máximo 4.000 UI (100 mcg) de vitamina D por dia. “Os suplementos, pelo menos nos Estados Unidos, não devem ter mais do que o UL em uma única dose. Mas você poderia tomar 10 doses, não podemos controlar isso”, disse Slavin.
Já no Reino Unido, onde Mitchener vivia, o Comitê Consultivo Científico sobre Nutrição recomenda 400 UI (10 mcg) por dia para todas as pessoas com quatro anos ou mais. Uma pessoa com 11 anos ou mais pode consumir até 4.000 UI (100 mcg). Pelo menos dois suplementos da NaturPlus UK contêm 5.000 UI (125 mcg) de vitamina D em uma única cápsula.
No Brasil, não existe uma política de fortificação de alimentos com vitamina D, como em outros países. Pesquisas indicam, aliás, que os brasileiros sofrem de deficiência da vitamina, mesmo com as altas temperaturas do país.
A quantidade indicada é: gestantes 600 UI, zero meses a oito anos 400 UI, nove a 18 anos 600 UI e 19 a 70 anos 800 UI. Pessoas que fazem parte dos grupos de risco podem ter os valores mais altos. Portanto, é importante manter o contato com o seu médico para saber qual o seu caso específico.
O nível de vitamina D foi testado em Mitchener antes de sua morte e mostrou uma pontuação de 380, “nível máximo registrado pelo laboratório”. Nenhuma unidade de medida foi listada, mas acredita-se que foi utilizado um exame de sangue em nanomoles por litro (nmol/L). O Escritório de Suplementos Dietéticos dos Estados Unidos considera a leitura acima de 125 nmol/L alta o suficiente para causar problemas.
Jamie Alan, Pharm.D, professor associado do Departamento de Farmacologia e Toxicologia da Michigan State University alertou que como a vitamina D ajuda a regular os níveis de cálcio no corpo, a hipercalcemia é um resultado direto da intoxicação.
“Os sinais de aumento de cálcio podem incluir fraqueza, fadiga e dores ósseas. Os sintomas mais graves podem incluir estupor, coma, cálculos renais, úlceras estomacais, náuseas, vômitos e diarreia e arritmias cardíacas”, lista.
Embora a intoxicação seja rara, é necessária muita atenção antes de consumir o suplemento. “Os suplementos vendidos sem receita médica podem não ser confiáveis em termos do que o suplemento contém e da dose que você realmente receberá. Vale a pena conferir se você decidir experimentar um suplemento OTC”, diz Alan.
Como obter uma quantidade segura de vitamina D
Apelidada de “vitamina do sol”, a melhor forma de adquirir a vitamina D é justamente com a exposição ao sol, sem protetor solar, por pelo menos 20 minutos. Os horários indicados são até às 10h da manhã e após às 16h da tarde.
Entretanto, é importante ficar atento aos cuidados que se deve ter ao procurar obter a vitamina D através do sol.
Ademais, existem diversos alimentos que proporcionam vitamina D: atum, sardinha, linguado, salmão, tilápia, cogumelos crus, iogurte natural, ovos, fígado bovino e leite de soja são alguns desses exemplos.
Além disso, é importante manter os exames de dia e, caso uma deficiência de vitamina D seja identificada, fazer a suplementação apenas sob acompanhamento médico, respeitando as doses indicados pelo profissional de saúde.