A gastrostomia é um procedimento cirúrgico que consiste em uma abertura através da parede abdominal, que dá acesso ao interior do estômago, para permitir a administração da dieta, ou seja, de alimentos e de líquidos.
Este método é bastante útil para tratar pessoas que têm o sistema digestivo funcional, porém não podem ou não conseguem se alimentar por via oral. Em situações assim, diz-se que a pessoa recebe uma nutrição enteral, por meio da qual a dieta líquida é administrada diretamente ao estômago, através de uma sonda (um pequeno tubo flexível) ligada à gastrostomia.
As refeições líquidas podem ser preparadas com a trituração dos alimentos sólidos ou pela preparação de fórmulas específicas. Em ambos os casos, é importante contar com a orientação de um nutricionista, para fazer o cálculo da necessidade calórica da pessoa em tratamento e, assim, indicar os alimentos e as quantidades ideais.
Veja a seguir quando a gastrostomia é indicada, como ela é feita, como deve ser o pós-cirúrgico, quais são os cuidados que se deve ter com a sonda, as possíveis complicações da gastrostomia, como usar a sonda para alimentar uma pessoa e como deve ser a comida.
Quando a gastrostomia é indicada
A gastrostomia é indicada para a nutrição de pessoas que estão impossibilitadas de se alimentar pela boca ou que não conseguem ingerir as calorias diárias necessárias, para a manutenção de seu metabolismo, correndo o risco de ficarem desnutridas.
Para que a gastrostomia seja indicada, é preciso que o estômago e o intestino estejam funcionando bem e que o problema seja restrito à deglutição dos alimentos.
Dessa forma, o objetivo com a gastrostomia é impedir que a pessoa fique desnutrida, quando estiver passando por condições que afetam sua capacidade de alimentação por via oral, como:
- Transtornos neurológicos: AVC, hemorragia cerebral, paralisia cerebral, demência, tumor no cérebro e doenças neurodegenerativas, como esclerose lateral amiotrófica (ELA), esclerose múltipla e doença de Parkinson.
- Condições neuromusculares: Elas podem fazer com que a pessoa coma muito lentamente, devido ao formato de sua boca ou à fraqueza dos músculos envolvidos na mastigação e na deglutição.
- Problemas na região orofaríngea e laringofaríngea: Tumores no esôfago e na garganta, dificuldade grave para engolir (disfagia), fístula traqueo-esofágica congênita.
- Doença de Crohn: A condição pode acometer a região do esôfago, causando estreitamento desse tubo, sensação de dor ao engolir e queimação.
- Insuficiência renal crônica: A doença pode causar alterações no eixo hipotálamo-hipófise, um sistema neuronal que influencia na deglutição.
- Descompressão gástrica: É um procedimento contrário ao da alimentação, que faz a remoção do conteúdo gástrico por meio da sonda. Esse procedimento pode ser feito para desobstruir a saída do estômago para o intestino delgado, que pode ocorrer por causa de úlceras no estômago ou tumor.
- Candidíase oral: Comum em pacientes com AIDS, a candidíase oral causa lesões na boca e na região orofaríngea, dificultando a deglutição.
- Após cirurgias envolvendo o sistema digestivo ou respiratório
Além disso, crianças pequenas podem precisar de uma gastrostomia, quando não conseguem se alimentar pela boca por um período superior a um mês.
Geralmente, esses são casos de disfagia, que é a dificuldade em engolir alimentos líquidos e sólidos. Quando a criança ou o adulto tem um problema desse tipo, ela engasga e aspira alimentos e saliva para os pulmões.
Quando a condição clínica que causa dificuldade para engolir é passageira e o paciente volta a conseguir a se alimentar pela boca, como numa recuperação pós-cirúrgica, a gastrostomia pode ser um método de nutrição temporário, podendo ser revertida, ao se resolver o problema de saúde.
Em alguns casos, porém, a gastrostomia pode ser uma via de nutrição utilizada por muitos anos, até mesmo durante o resto da vida.
Como é feita a gastrostomia?
O procedimento cirúrgico realizado para criar a abertura artificial externa do estômago requer uma incisão no epigástrio da pessoa, que é a parte média-superior (acima do umbigo) do abdômen.
Antes da cirurgia, é administrada a anestesia geral, ou um remédio sedativo, para provocar sono no paciente e anestesiar a sua pele, de modo que o tubo possa ser colocado sem causar desconfortos.
Esse procedimento pode ser realizado de duas formas:
- Abordagem cirúrgica tradicional: É feita uma incisão no abdômen para chegar até o estômago e inserir a sonda.
- Gastrostomia endoscópica percutânea: É menos invasiva, o tubo é colocado no estômago pela pele por endoscopia e guiado por radiografia ou ultrassonografia.
Primeiramente, é inserida uma sonda pelo nariz (sonda nasogástrica) ou pela boca (sonda orogástrica), que chega até o estômago. Com isso, se enche o estômago de ar.
Depois disso, a região do abdômen onde será feita a incisão é limpa e isolada. Com o auxílio das imagens geradas pela radiografia ou ultrassonografia, o médico ou médica cirurgião faz uma incisão na pele da pessoa. A partir dessa abertura, se perfura também o estômago.
O orifício aberto na pele é chamado de estoma, que tem aproximadamente o diâmetro de um lápis. No estoma é colocada a sonda que faz a conexão do meio externo com o interior do estômago.
O tempo de internação varia de acordo com a idade e com o estado de saúde da pessoa. A cicatrização do estômago e da pele onde houve a incisão demora, em média, de cinco a sete dias.
Após a cirurgia de gastrostomia
Após a cirurgia, a pessoa é observada, quanto à frequência cardíaca e pressão arterial durante um período de aproximadamente quatro horas.
Nas primeiras 24 horas após a cirurgia, a sonda ainda não pode ser utilizada para alimentar o paciente, o que deve ser feito por via intravenosa (pela veia).
Quando o médico constata que há ruídos no sistema gastrointestinal, o que é sinal de que está funcionando, a pessoa pode começar a receber pequenas doses de alimento pela sonda, que vão sendo aumentadas gradativamente.
Cuidados com a sonda
No hospital, você vai aprender com a equipe de enfermagem a como cuidar da ferida feita na gastrostomia. Esse cuidado é muito importante, para evitar que haja infecções microbianas no local e inflamação.
Para evitar a infecção, é preciso lavar o local cuidadosamente, com água morna, gaze estéril e sabão com pH neutro.
Além disso, o paciente deve usar roupas apertadas que pressionem a abertura da gastrostomia, e nem passar cremes perfumados ou outro tipo de produto químico na pele.
O médico orientará quanto à necessidade de rodar a sonda, ao lavar o local da gastrostomia.
Geralmente, é preciso fazer esse procedimento uma vez ao dia, para evitar que a sonda se fixe na pele e cause ranhuras e aberturas, que facilitam o surgimento de uma infecção.
Possíveis complicações da gastrostomia
Embora raras, podem ocorrer complicações, como hemorragia, peritonite, que é uma infecção dentro da cavidade abdominal, e danos ao cólon.
Outras possíveis complicações da gastrostomia são:
- Vazamento de alimento ou de fluidos ao redor da sonda, na parede abdominal
- Desalojamento da sonda
- Inflamação no local de incisão e ao redor da sonda
- Náuseas e diarreia
Ao notar qualquer uma dessas complicações, é fundamental comunicar imediatamente o médico ou procurar atendimento em um serviço de saúde, para ver se é necessário fazer alguma intervenção.
O médico também deve ser informado rapidamente quando o tubo sair, se houver muita drenagem ao redor do tubo, principalmente se também houver pus, se o paciente tiver febre de 37,8º C ou mais ou se ocorrer dor de intensidade forte com a alimentação.
Caso precise ir ao hospital ou pronto-socorro devido a uma emergência, recomenda-se que o paciente forneça todas as informações úteis que tiver a respeito da sua gastrostomia, como a data em que ela foi feita, o tamanho do tubo, o tipo de tubo, a cópia do laudo da realização do procedimento e o contato da clínica responsável.
Se a sonda da gastrostomia for puxada acidentalmente, a orientação é levá-la junto ao hospital ao pronto-socorro.
As chances de complicações pós-cirúrgicas, como em qualquer outra cirurgia, são maiores nos seguintes grupos de risco:
- Fumantes
- Obesos
- Pessoas que consomem álcool com frequência
- Usuários de drogas ilícitas
O uso de alguns medicamentos antes da cirurgia também pode contribuir para complicações pós-cirúrgicas, por isso é fundamental seguir corretamente todas as instruções dadas pelo médico. Normalmente, as classes de medicamentos contraindicados são:
- Antiagregantes plaquetários: Aspirina (AAS), bissulfato de clopidogrel, ticagrelor
- Anticoagulantes: Varfarina, rivaroxabano, dabigatrana
- Anti-inflamatórios: Ibuprofeno, naproxeno, piroxicam
- Anticoncepcionais à base de hormônio: Pílula, injeção, adesivo
- Insulina e outros medicamentos para diabetes: Metformina, gliclazida, glibenclamida
- Medicamentos fitoterápicos: Cápsulas de alho, valeriana, ginseng
- Vitamina E e suplementos energéticos: Cápsulas de cafeína, guaraná e chá verde
Como usar a sonda para alimentação
Para alimentar uma pessoa usando a sonda de gastrostomia, são necessários alguns cuidados:
- Sente a pessoa em uma cadeira ou deixe-a mais elevada na cama, de forma a impedir o retorno do alimento do estômago para o esôfago, o que pode causar uma sensação de azia.
- Lave bem as mãos com água e sabonete neutro antes de depois de tocar a área com gastrostomia.
- Veja se o tubo está bem esticado, sem dobras, que possam impedir a passagem do alimento.
- Feche o tubo fazendo uma dobra em sua ponta ou usando o clip, para impedir a entrada de ar quando você retirar a tampa do tubo.
- Abra a tampa do tubo, sem soltar a dobra, e insira a seringa de 100 mL de alimentação no tubo de gastrostomia.
- Desdobre o tubo e puxe lentamente o êmbolo da seringa para aspirar o líquido que estiver dentro do estômago. Volte esse conteúdo para o estômago da pessoa. Caso tenha saído mais do que 100 mL do estômago, é recomendado esperar mais algumas horas para alimentá-la, quando o conteúdo for mais baixo que isso.
- Dobre a ponta da sonda novamente ou feche o tubo com o clip. Retire a seringa.
- Encha a seringa com 20 a 40 mL de água e insira-a na sonda. Desdobre a sonda e pressione o êmbolo da seringa lentamente, para injetar toda a água no estômago.
- Dobre novamente a ponta da sonda ou feche o tubo com o clip e retire a seringa.
- Encha a seringa com um volume de 50 a 60 mL de comida líquida.
- Repita os passos para fechar o tudo e inserir a seringa na sonda, tomando cuidado para não deixar o tubo aberto e evitar a entrada de ar.
- Cuidadosamente, empurre o êmbolo da seringa, inserindo a comida devagarzinho no estômago.
- Repita o processo de inserção da seringa com o alimento, até finalizar o volume recomendado pelo médico ou nutricionista, que normalmente não passa de 300 mL.
- Finalizado o processo de alimentação pela sonda, lave a seringa e encha-a novamente com 40 mL de água. Volte a colocar através da sonda para lavá-la e para evitar a obstrução do tubo com restos de alimento.
- Mantenha a pessoa sentada por 30 minutos.
Como deve ser a comida
A comida deve ser bem triturada e ter consistência líquida, para não obstruir a sonda. Para evitar os pedaços maiores, coe a mistura antes de inseri-la na seringa.
Os alimentos inseridos nessa dieta líquida através da sonda sempre devem ser orientados por um nutricionista, a fim de evitar carências nutricionais.
Fontes e referências adicionais
- Perfil de pacientes com paralisia cerebral em uso de gastrostomia e efeito nos cuidadores, Revista CEFAC, 2012; 14(5): 933-942.
- Gastrostomia e jejunostomia: aspectos da evolução técnica e da ampliação das indicações, Medicina (Ribeirão Preto), 2011; 44(1): 39-50.
- O uso da gastrostomia percutânea endoscópica, Revista de Nutrição, 2005; 18(4): 553-559.
Fontes e referências adicionais
- Perfil de pacientes com paralisia cerebral em uso de gastrostomia e efeito nos cuidadores, Revista CEFAC, 2012; 14(5): 933-942.
- Gastrostomia e jejunostomia: aspectos da evolução técnica e da ampliação das indicações, Medicina (Ribeirão Preto), 2011; 44(1): 39-50.
- O uso da gastrostomia percutânea endoscópica, Revista de Nutrição, 2005; 18(4): 553-559.