A pandemia do novo coronavírus tem sido um momento de tensão. As notícias acerca da COVID-19 são preocupantes, os seus números no Brasil são alarmantes, ela exige que fiquemos muito tempo isolados em casa e o que o novo coronavírus pode fazer no organismo assusta qualquer um, fora o impacto financeiro que isso provocou em muitas famílias.
Assim, em certa medida, a saúde mental de quase todo mundo tem sofrido nesses tempos de pandemia. Entretanto, para algumas pessoas, o efeito pode ser pior e resultar no desenvolvimento do estresse pós-traumático.
A psiquiatra e autora do livro “The Unspeakable Mind: Stories of Trauma and Healing from the Frontlines of PTSD Science” (A Mente Indizível: Histórias de Trauma e Cura das Linhas de Frente da Ciência do Estresse Pós-Traumático, tradução livre), Shaili Jain, prevê quais são grupos que poderão ser afetados pelo estresse pós-traumático:
- Quem perdeu um ente querido na pandemia: “Não poder estar no leito (do ente querido) é difícil. Os funerais não estão ocorrendo, então todas aquelas coisas que nós fazemos como sociedade para nos proteger e passar pelo luto não estão lá”, explicou Jain;
- Sobreviventes da COVID-19: Pesquisas mostraram que há muito estresse pós-traumático em sobreviventes de unidades de terapia intensiva (UTIs) porque muitos podem lembrar do período em que pensaram que iam morrer;
- Pessoas afetadas financeiramente pela crise: A crise da COVID-19 também afeta a economia e a psiquiatra apontou que em um cenário de recessão e desemprego alto vem junto de muito trauma e podem haver episódios de violência familiar ou conjugal, que podem contribuir com o desenvolvimento do estresse pós-traumático;
- Quem trabalha na linha de frente: Em uma pandemia de um vírus tão contagioso como o novo coronavírus, os profissionais de saúde precisam lidar com a morte dos pacientes e com a ameaça de serem expostos ao vírus, o que também pode causar trauma nesses trabalhadores essenciais.
Sinais de alerta
Depois de passar por algum tipo de trauma, qualquer pessoa apresenta sinais de estresse pós-traumático nas primeiras horas, dias e semanas. Jain afirmou que é normal sentir-se muito alerta, ansioso, ter o sono perturbado e memórias do trauma.
“É a forma do seu cérebro se adaptar ao trauma. Ele fica hiper alerta no caso de você precisar se proteger. (A maioria) vai voltar ao normal”, completou a psiquiatra.
Entretanto, se os sintomas continuarem por meses e aumentarem depois que o desastre ou evento traumático não for mais uma ameaça, se os níveis de estresse impedirem de trabalhar ou fazer suas tarefas, se tiver pensamentos acerca de se machucar ou machucar outra pessoa, você poderá estar experimentando um distúrbio psicológico como depressão, ansiedade ou estresse pós-traumático.
No entanto, segundo o professor associado do Departamento de Psiquiatria e diretor assistente do Centro de Estudo de Estresse Traumático da Universidade de Serviços Uniformizados dos Estados Unidos, Joshua Morganstein, essas condições ocorrem ao longo do tempo e com menos frequência.
De qualquer forma, vale saber que o estresse pós-traumático também está associado a sintomas como:
- Pesadelos com o evento traumático;
- Angústia emocional severa ou reações físicas a algo que lembre o evento traumático;
- Tentar evitar falar ou pensar no evento traumático;
- Evitar lugares, atividades e pessoas que lembrem o evento traumático;
- Pensamentos negativos sobre si mesmo, outras pessoas e o mundo;
- Desesperança em relação ao futuro;
- Problemas de memória, incluindo não lembrar aspectos importantes do evento traumático;
- Dificuldade para manter relacionamentos próximos;
- Sentir-se distante da família e amigos;
- Dificuldade para experimentar emoções positivas;
- Sentir-se emocionalmente anestesiado;
- Ficar irritado ou assustado com facilidade;
- Comportamentos autodestrutivos como beber demais ou dirigir em alta velocidade;
- Dificuldade de concentração;
- Explosão de raiva;
- Comportamento agressivo;
- Culpa ou vergonha esmagadora.
Os sintomas do estresse pós-traumático podem ocorrer dentro de um mês após o evento traumático, mas às vezes podem não desaparecer até anos depois do ocorrido. Ao apresentar os sinais da condição ou perceber os sintomas em alguém que você conhece, especialmente se tiver passado por um evento traumático, procure rapidamente o auxílio de um psicólogo.
A saúde de quem não desenvolve o estresse pós-traumático também pode sofrer
Reações como dificuldade para dormir, sentir-se distraído, bravo, inseguro e preocupado em contrair a COVID-19 atinge mais pessoas e vêm antes do desenvolvimento do estresse pós-traumático.
Segundo Morganstein, problemas como se sentir inseguro ou não dormir bem têm implicações expressivas na saúde e são grandes problemas de saúde pública. Como forma de lidar com o estresse, as pessoas também podem aumentar o uso de álcool, cigarro e medicamentos.
O que é péssimo porque além da automedicação ser algo muito perigoso, as bebidas alcoólicas afetam a imunidade e aumentam o risco de contrair o novo coronavírus e também um estudo mostrou que o novo coronavírus é especialmente perigoso para os fumantes.
O sofrimento experimentado durante a pandemia também pode causar mais conflito familiar. “Pessoas também têm dificuldade para equilibrar trabalho em casa, então eles vão se focar nos problemas de trabalho e/ou no negócio natural de gerir os desafios da crise a um nível que a sua saúde, bem-estar, conexões sociais e outras coisas que poderiam ajudar a protegê-los em longo prazo podem ser negligenciadas”, disse o diretor assistente do Centro de Estudo de Estresse Traumático.
Por outro lado, muitas pessoas podem mostrar resiliência ao enfrentar tudo isso. Morganstein acredita que em última instância a maioria das pessoas vai ficar bem, inclusive as que tiveram dificuldade no meio do caminho e aquelas que tem problemas de saúde mental de base ou já existentes.
No entanto, para que consigam ficar bem, muitas dessas pessoas podem precisar da ajuda profissional de um psicólogo ou psiquiatra, principalmente quem já tem ou tinha uma condição que afeta a saúde mental.
Portanto, quem enfrentar dificuldades emocionais e de ordem de saúde mental durante a pandemia que levem a comportamentos não saudáveis e não conseguir resolvê-los sozinho, deverá buscar ajuda profissional. É fundamental começar a prestar atenção desde já na saúde mental e encontrar maneiras saudáveis de cuidar dela.